Recado aos formadores de opinião na área musical

    Autor Mensagem
    emanuel macedo
    Veterano
    # ago/06


    Diferentemente do que possa sugerir o título, este artigo não irá focalizar-se em acusar músicos ou bandas que produzam discos ou shows de qualidade questionável. Minha idéia é contestar a autoridade dos que se sentem no direito de definir o que é bom ou ruim, enfim, centralizar o assunto no chamado "formador de opinião".

    Quase todos os "formadores de opinião",sejam eles verdadeiros ou falsos, profissionais ou aspirantes, bons ou ruins, sofrem de uma mesma patologia: a síndrome da "Bola de Cristal" acompanhada de uma pitada venenosa de maniqueísmo.

    É comum vê-los, ouvi-los ou lê-los fazendo profecias apocalípticas sobre o futuro, sentindo-se os donos da verdade e, também, com alguma freqüência, sentindo-se os guardiães da qualidade artística e da paz na galáxia. Em alguns casos mais crônicos, eu ainda acrescentaria um "compulsivo impulso" exibicionista.

    Muitos simplesmente passam a maior parte do tempo desfilando sua erudição, suas credenciais e seus conhecimentos técnicos em vez de concentrar-se no assunto em pauta.

    Vamos, porém, analisar alguns fatos de um passado não muito distante. O Samba e o Choro, gêneros reconhecidos como genuinamente brasileiros, são resultantes de uma mescla de diversas influências, quase todas estrangeiras (africanas e européias).

    Não faz sentido, portanto, sofrer de xenofobia em nenhum país nas Américas, pois a invasão, a colonização, os massacres, a industrialização, a imigração, a escravidão e a esperança de um novo mundo são mais do que opiniões: são fatos que têm origens alienígenas.

    No caso do Brasil, a crise de identidade reside no grande e insano complexo de inferioridade que temos cultivado ao longo dos tempos. Voltando ao exemplo do Choro e do Samba, estes dois gêneros, logo que surgiram e mesmo durante muito tempo foram qualificados como "música de vagabundo".

    A mesma coisa continua acontecendo até hoje com outros tipos de música, sendo que, no caso do samba, criou-se um segmento de apelo mais popular intitulado "pagode", mas que,no meu entender, continua sendo samba, por mais ódio que os "formadores de opinião" alimentem contra os "pagodeiros" e a
    suposta "deterioração" do gênero.

    Hoje moro nos EUA e percebo que, qualquer gênero musical popular oriundo de outros países e no qual os americanos reconheçam haver muita sofisticação, é imediatamente qualificado como "influenciado pelo jazz". Isso faz parte do complexo de superioridade e megalomania dos americanos.

    Nós, brasileiros, passamos a acreditar nisso e a ver nesta influência um grande toque de classe e requinte, ao mesmo tempo preservando o "popular". Eu adoro jazz, mas não vejo sentido em dizer que Tico-Tico no Fubá (bastante conhecida por aqui) tenha influência do jazz.

    Não concordo que a modernização harmônica da música brasileira seja oriunda do jazz, mas sim do choro. O problema é que nunca formalizamos nem divulgamos este conhecimento de forma tão sistemática como os americanos fazem.

    O surgimento recente de um músico extraordinário como Hamilton de Holanda (bandolinista de Brasília) me traz muita alegria, pois ele desenvolve um importante trabalho de ensino e organização do conhecimento musical do choro.

    A sofisticação do choro é tanta, que o violonista erudito paraguaio Agustín Barrios (na minha opinião, o mais original e criativo do século passado) compôs uma belíssima e sofisticada obra conhecida como Choro da Saudade.

    Mas voltando aos "formadores de opinião": muitos criticam a simplicidade harmônica de gêneros musicais como o rock e a axé music, mas esquecem que Luiz Gonzaga compôs obras belíssimas com cerca de 5 acordes naturais. Mais ainda, que o ilústre sanfoneiro compunha suas melodias em cima de um português que seria reprovado em qualquer redação de vestibular e pelos vetustos professores do nosso idioma.

    Mas a qualidade artística de Luiz Gonzaga é inquestionável. Se esse argumento da harmonia for levado muito a sério, toda a música popular, com raríssimas exceções, se veria ajoelhada diante da música erudita, o que para mim não faz nenhum sentido. Cada gênero musical tem suas características próprias, sejam elas mais centradas em harmonização, ritmo, melodia ou letra. Não são piores nem melhores, são simplesmente diferentes.

    Todos os gêneros musicais, em seu princípio, são sempre criticados pelos "formadores de opinião", salvo aqueles que estão "engajados com o movimento cultural". Assim aconteceu com Stravinski, com o Samba, com o Choro, com o Rock e com o pagode. Acredito que o crivo do tempo é o mais eficiente crítico. Basta olhar para o passado e perceber que o que acontece hoje não é muito diferente: sempre houve compositores muito preocupados com o aspecto comercial e outros preocupados simplesmente em compor, mesmo que os ouvintes só fossem aparecer décadas depois.

    E houve, também, os compositores dos quais nunca mais ouvimos falar, mas que foram muito famosos em seu tempo (bons ou ruins). Obviamente, o mesmo se aplica aos produtores e empresários, apenas os nomes mudaram ao longo do tempo.

    Sempre houve muito prestígio, dinheiro, ciúmes, mediocridade, destempero e genialidade no meio artístico, não poderia ser diferente agora. Acredito, pura e simplesmente, que cada artista cumpriu sua função dentro de sua época e contexto, seja durante meros 15 minutos ou por 15 longos séculos. Coube ao público e às gerações futuras aclamá-los ou abominá-los.

    Aliás, para que não pensem que estou contra todos os "formadores de opinião", preciso salientar que os músicos — sejam eles extraordinários, bons, ruins ou péssimos — também são formadores de opinião (aqui sem aspas), como já citei exemplo anteriormente. Muitos deles, inclusive, estão livres de todas as patologias que listei no início e contribuem ativamente para o enriquecimento e divulgação da nossa música, sejam resgatando coisas do passado, reprocessando o presente ou demonstrando real preocupação com o futuro.

    Eugenio Reis

    som
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    bom texto

    fernando tecladista
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    pior do que esses formadores de opnião é uma rempa de "vai com as outras" que entram na onda e saem por ai como discipulos dessa cambada

    e juntando isso com a turminha do
    fulano** disse... (**nome de um pseudo importante)
    eu li na revista tal
    saiu no jornal XX
    apareceu na coluna do fulado

    já vi varios comentarios do tipo
    eu li na coluna do fulano que sai na revista tal que o cd da banda XXX é o pior de todos
    ai eu pergunto: você já ouviu?
    e o cara diz: não... mas nem vou ouvir depois do que li

    :(

    storrecilha
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    Opa, muito bom o texto...
    e alias, outro dia estava conversando com um colega musico (violonista) e concordamos que muitos dizem que a Bossa Nova é o "brazilian jazz", mas é o Choro que devia ocupar posição de destaque na nossa história musical!!! Chorinho é muito bom!!!

    Jonathas Lacerda
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    muito bom esse artigo!

    Concordo com o Storrecilha qdo diz q a Bossa Nova é o "Brazilian Jazz". Mas também concordo que o choro deveria ser destaque na história musical. Chorinho eh sHOW De bola...

    qdo toquei Piano no CEFET daqui, o nosso maestro (orquestra de camara), um brasileiro muito nacionalista sempre valorizou a nossa música em nosso repertório. Era Choro sempre, além de algumas suítes regionais de baião, e pra completar o repertório, alguns clássicos da música mundial do século 18, mas nada era tão bom de executar quanto o Choro...

    mano_a_mano
    Veterano
    # ago/06 · Editado por: mano_a_mano
    · votar


    O Brasil é reconhecidamente dono da melhor música DO MUNDO. E isso foi comprovado INTERNACIONALMENTE.
    O que acontece é que tem muitos "músicos" que não estão nem um pouco preocupados com a melodia, a harmonia e o ritmo da nossa bela música, e sim com dinheiro, vendas, mercado. Foi isso que criou os Tchans, Tchês, Funks da vida. Como sempre tem um "zé povão" que só escuta aquilo que dá no rádio, então essas "coisas" sempre fazem sucesso.
    Mas nem tudo está perdido: temos grandes e atuais artistas como Zeca Baleiro, Zelia Duncan, Los Hermanos (que no começo eu não gostava muito porque só dava "Anna Júlia" nas FMs, mas depois descobri ser uma banda de excelente qualidade, e já ando até pensando em fazer algo parecido no futuro), ou seja, de uma certa forma a MPB está reflorescendo - o que parecia impossível há uns 25, 30 anos atrás (e todos sabem por quê, né?).

    emanuel macedo
    Belo texto, hein? Poderia muito bem estar numa revista de música :-)

    Eduardo 336
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    emanuel macedo
    Messias?

    storrecilha
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    mano_a_mano
    Não gosto nem um pouco do zéca baleiro, acho que ele só tem imagem de engajado mas as músicas não dizem nada, nem na letra nem na harmonia (minha opinião é claro), já a Zélia Duncan, gosto muito, e para completar, acho q poderia incluir nesta lista de bons nomes reflorescendo a MPB, o Paulinho Mosca, Jairzinho, Pedro Mariano e Maria Rita...
    Mas no campo da musica instrumental, tem muita gente boa que não aparece na mídia, como o Aleh Ferreira e as Choronas (chorinho), vários instrumentistas solo como Michel Freidenson, Zuzzo, Arthur Maia, Mozart Mello, ish tem muita gente...

    Jonathas Lacerda
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    sou fã incondicional de Mozart Mello...

    Ken Himura
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    Eu nunca dei bola pra Críticos, ainda mais os que não são musicistas.

    Crítico só vê defeito.

    Bob Wilson
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    Críticos, em sua maioria, são músico ou frustados (pq não conseguem tocar do jeito que gostariam) ou extremamente ranzinzas (pq fazem algo tão chato que só eles mesmos conseguem ouvir).

    Concordo em gênero, número e grau. O povo tem mania de malhar determinados ritmos só pq não se faz um "C7+/9/#11/13" e sim um C7. É o caso do rock: o baixista que toca comigo disse "ah eu detesto rock, principalmente no baixo, pq aquilo é muito fácil e pobre". Daí mostrei algumas coisas para ele (Dream Theater principalmente) e mandei ele fazer....pergunta se conseguiu. Ou então teve uma música do Fernandinho que ele está apanhando que nem cachorro para pegar o Riff (chama-se Há um rio). Este riff é um simples harpejo utilizado exaustivamente no Metal :) Engraçado como o rock era "pobre" né? :)

    Então é fácil demais malhar os ritmos que vc não gosta (e pior: que vc não sabe) só pq vc não consegue tocar ou pq eles fazem algo diferente do que você gosta. Existem ritmos que eu não curto mesmo, mas vou fazer o quê? Sair matando? Não. Acho que quase todos os estilo tem algo que vc possa aproveitar.

    deives
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    A música é simplesmente isso:
    estilo
    simplicidade
    alma
    dom de Deus
    ....e ninguem pode questionar !!!

    Ken Himura
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    A música é simplesmente isso:
    estilo
    simplicidade
    alma
    dom de Deus
    ....e ninguem pode questionar !!!

    Pra mim, música é apenas estudo e inspiração, se intercalando. =]

    jfguittar
    Veterano
    # ago/06
    · votar


    Digo a voces apartir de hoje, todos só vão ouvir o que é agradavél ao ouvido e a alma tomem.

    jfguittar
    Veterano
    # ago/06 · Editado por: jfguittar
    · votar


    Isso é que é formar opinião e não discutam

      Enviar sua resposta para este assunto
              Tablatura   
      Responder tópico na versão original
       

      Tópicos relacionados a Recado aos formadores de opinião na área musical