O Novo Código Florestal e a Guerra Civil Brasileira

    Autor Mensagem
    Kobberminer
    Veterano
    # jun/11


    Caros.

    De vez em quando pinta na mídia a questão acerca do novo Código Florestal Brasileiro. O projeto de lei está tramitando agora pelo Senado e, segundo Romero Jucá, líder do Governo no Senado, foi pedido a presidente Dilma Rousseff um prazo de 180 dias para que a casa analise o texto e decida pelas reformas do Código Florestal.

    Bom, acho que poucos aqui tem alguma idéia do que está acontecendo de verdade, do que se trata o novo Código Florestal, quais são as mudanças propostas por ele e principalmente, como isso irá afetar a nossa vida. Neste tópico pretendo apresentar a questão pra depois, talvez, rolar uma discussão sobre o tema. Então, começando:

    O que é o Código Florestal?

    O Código Florestal é um conjunto de normas, leis e diretrizes que visam regularizar o uso e a exploração das terras privadas. O primeiro Código Florestal Brasileiro nasceu em 1934, no governo de Getúlio Vargas, e visava uma blindagem da economia nacional contra uma possível crise no mercado de lenha. Sim, exatamente isso que voce leu. Não tinha nada a ver com preservação da Natureza ou coisas do gênero. O legislador da década de 30 tinha um enorme desafio quanto a regularização das terras nacionais: não havia como controlar as terras públicas. O uti possidetis era a corrente dominante, e qualquer um que ocupasse pacificamente uma área se tornaria seu dono legal. Portanto, o Governo só poderia ter um controle real sobre as terras rurais privadas. Como a lenha na época era a principal matéria-prima para a geração de energia, uma crise no setor madeireiro poderia ter sérias conseqüências para a economia, e para o país como um todo. Por isso, originalmente, foi necessário o Código: para que, num caso de crise, tivéssemos uma reserva de madeira em cada propriedade rural do país.

    Como evoluiu o Código Florestal?

    O Código de 1934 determinava que todos os proprietários rurais mantivessem 25% da área do imóvel coberta por mata original. Era a chamada "quarta parte". Porém mesmo instituído em 1934, essa determinação "não pegou", e até a década de 60 praticamente todos os proprietários rurais continuaram a explorar 100% da área de suas terras. Por isso na década de 60, já no Governo Militar, formou-se um grupo visando estudar novas regras para regulamentar o uso adequado das terras, baseando-se na lei vigente. O legislador dessa época partiu do pressuposto (correto) de que uma parte de cada bioma devesse ser preservada, porém também partiu do pressuposto (incorreto) de que os biomas nacionais estavam totalmente cobertos por propriedades privadas. Ora, se os biomas tinham ser preservados e, em sua totalidade eles estavam sob terras particulares, então a única forma de preservá-los seria regularizando as terras privadas.

    Nisso, o Governo manteve a determinação de que os proprietários de terras devessem ter uma parte do imóvel preservada com mata original. Essa parte foi chamada de Reserva Legal (RL). Foi instituído que a Reserva Legal do imóvel seria de 50% na Amazônia, e de 20% no restante do país. Além disso, criou-se o conceito de florestas protetoras. As florestas protetoras eram aquelas que sua manutenção seria necessária para a proteção dos recursos hídricos (nascentes, rios, lagos) e de áreas de risco (encostas íngremes e dunas). A lei chamou essas florestas de Áreas de Preservação Permanente (APPs). Com isso, o então presidente General Castelo Branco promulgou em 1965 a lei que reformava o Código Florestal de 1934, e que continua vigente até hoje.

    Quais foram as complicações do Código Florestal de 1965?

    Assim como o de 1934, o Código Florestal de 1965 também não pegou. Nos assentamentos feitos pelo INCRA na região amazônica nos anos 60-70, os colonos eram muitas vezes obrigados a desmatar 50% das terras que recebiam. Isso era uma demonstração do comprometimento do colono com a terra recebida. Tudo isso feito com a fiscalização do Governo. Outras vezes, quando se desmatava 100% da terras, o Governo dava aos colonos uma outra parte de terras correspondente ao tamanho da propriedade para que se mantivessem os 50% de Reserva Legal e os 50% de uso. Nos lugares onde não houve fiscalização, tanto na Amazônia quanto no resto do país, as áreas desmatadas ultrapassavam largamente o limite da Reserva Legal, ainda nos anos 60-80. Nessa época, praticamente 100% dos imóveis rurais tinham alguma espécie de irregularidade, seja ultrapassando o limite da RL, seja cultivando em áreas que deveriam ser APPs.

    A Década de 90

    Todo esse quadro de inobservância da lei foi piorado em 1996, quando o Governo criou uma nova lei. Apenas três anos depois da ECO92, no Rio de Janeiro, o Governo observou um pico de desmatamento na Região Amazônica. Foram desmatados 2.905.900 hectares (29.059 Km²) de florestas, um recorde histórico. A pressão internacional feita sobre o Brasil acabou fazendo com que o então presidente Fernando Henrique Cardoso assinasse a Medida Provisória 1.511/96, que mudou o percentual de RL na Floresta Amazônica, previsto no Código Florestal, de 50% para 80%. Os colonos assentados na década de 60-70 que foram instruídos pelo Governo a desmatar 50% das terras ficaram à margem da lei. Esta MP entrou em vigor na sua data de publicação (como é usual no Brasil) e não deu o menor prazo para que os produtores se regularizassem. Essa MP nunca chegou a ser apreciada pelo Legislativo e sofreu dezenas (sim, dezenas) de reedições até o ano 2000.

    Naquele ano foi criada uma comissão mista de Deputados e Senadores com o intuito de solucionar o problema acerca da MP 1.511/96 em vigor. Para isso, criaram um PLC (projeto de lei de conversão) que visava alterar o texto da MP 1.511/96 assinada por FHC. A comissão, dominada por ruralistas, conseguiu, em meio a intensos debates e xingamentos entre eles e os deputados verdes, aprovar a PLC 10/2000, que praticamente revogava as alterações da MP 1.511/96.

    Após a aprovação na Comissão Mista, os verdes conseguiram abafar a tramitação da PLC no Legislativo, e através do CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) aprovaram uma MP que reinstituía tudo aquilo estabelecido pela MP 1.511/96. Esta MP da CONAMA sofreu 67 alterações até que uma mudança na Constituição obrigava que todas as MPs aprovadas que ainda não tivessem sido apreciadas pelo Congresso (como era o caso da MP 1.511/96), passavam a ficar automaticamente dispensadas de novas revisões e passariam a vigorar ad eternum ou até que o Congresso as revogasse.

    E é aí que começa o problema.

    A irresponsabilidade de Carlos Minc e o Novo Código Florestal

    A MP 1.511/96 foi restabelecida e muitos dos produtores da Região Amazônica ficaram oficialmente à margem da lei (sem falar quase todos os outros produtores brasileiros que já estavam irregulares desde a época do Código Florestal de 1965). Porém, ainda não havia uma legislação específica para lidar com os crimes ambientais. Na verdade, essa legislação já existia, só que ela estava no fundo da gaveta de Marina Silva e ficou assim durante todo o período em que ela ficou à frente do MMA (Ministério do Meio Ambiente). Ela sabia que quase a totalidade dos produtores rurais não tinham como se regularizarem rapidamente nos moldes dessa legislação. Ela sabia da situação. Em 2008, Carlos Minc assumiu o MMA, e irresponsavelmente retirou o decreto do fundo da gaveta e o enviou ao então presidente Lula com recomendações para que se assinasse. Nisso, em 22 de Julho de 2008, Lula e Minc assinaram o Decreto 6.514/08 que regulamentava a Lei de Crimes Ambientais. Ela dava um prazo de 180 dias a partir da data de publicação para que os produtores rurais averbassem em cartório as áreas de RL que deveriam manter, previstas no Código Florestal de 1965 (para todos os produtores brasileiros) e na MP 1.511/96 (para o caso dos produtores da Região Amazônica). Acontece que averbar a RL não é uma tarefa simples, e na maior parte dos casos é também muito cara. Além disso, 180 dias é um prazo curtíssimo para todo esse processo. Com a pressão do setor ruralista, somado a incapacidade prática dos produtores de se ajustarem a lei, o então presidente Lula assinou na véspera de vencer o prazo determinado de 180 dias o Decreto 6.686/08, que adiava por mais 1 ano o prazo determinado, ou seja, para Dezembro de 2010.

    Durante esse 1 ano rolou intensa disputa entre os setores ruralistas e ambientalistas sobre como deveria ser solucionada a questão. Até que alguns deputados sugeriam a idéia de realizar uma reforma no vigente Código Florestal de 1965, a fim de contornar o problema e, naturalmente, atualizar a lei. Nesse interim, nenhuma solução definitiva para o problema foi dada, e findando o prazo de 1 ano para a regularização, o então presidente Lula assinou o Decreto 7.029/09 que adiava novamente (desta vez para 11 de Junho de 2011, uma data já fora do seu mandato) o prazo para a regularização dos produtores rurais.

    O que está atualmente ocorrendo de fato é a reforma do Código Florestal, mas não vou descrever os detalhes dessa parte do processo porque só isso já daria um post bem maior que este. A última "novidade" de Brasília é que o Novo Código já foi aprovado pela Câmara e está agora em tramitação pelo Senado.

    Acontece que o prazo dado pelo decreto do presidente Lula vence no dia 11 de Junho (daqui a 1 semana). Se a presidente Dilma não assinar um decreto adiando mais uma vez o prazo (o que é bem provável que ocorra), os produtores irregulares que não puderem pagar pela regularização vão sofrer o rigor da lei, talvez até uma Derrama. Só que não são 1, 2, 37, 29564 produtores... estimativas feitas pelo próprio Governo apontam que 70% dos agricultores nacionais não tem condições de se adequarem ao antigo Código. Se não aprovarem o Novo Código ou se a Dilma não adiar este prazo dentro de 1 semana, creio que será dada a Derrama. Então, o que virá? Eu aposto na Guerra Civil...

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    Deu um trabalho do cão escrever tudo isso, mas não daria pra expor o problema faltando partes...

    Pra quem teve saco de ler tudo, dissertem :)
    Valeu!

    "Quando o direito ignora a realidade, a realidade se vinga ignorando o direito."
    Georges Ripert. Jurista francês.

    Sam Keat
    Veterano
    # jun/11
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    aposto em greve por parte dos produtores, fazendo a economia cair





    ... mas eu to por fora...

    Kobberminer
    Veterano
    # jun/11
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    Sam Keat
    aposto em greve por parte dos produtores, fazendo a economia cair

    O maior problema não é nem a economia. Aqui estamos tratando de alimentos. Imagina se o setor energético entrasse em greve geral? Não teríamos luz, e imagina o caos que isso geraria (considerando que 1 dia de apagão já quase provoca uma guerra no Brasil...)

    Agora, na melhor das hipóteses, nós podemos viver sem energia elétrica. E comida?

    brunohardrocker
    Veterano
    # jun/11
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    De um lado ecoterroristas hipócritas que nunca brigaram pelo reestabelecimento da mata ciliar do Tietê na grande São Paulo e que usam como unidade de medida campos de futebol e de outro uma classe desunida que não leva em conta que aumentar a área de produção só fará com que sua mono-cultura tenha um custo ainda maior e uma maior desvalorização no mercado.

    Pra chegar num acordo, só saindo dar garras dos dois extremos e resolver com racionalidade, coisa que nunca vai acontecer enquanto estiverem muito mais interessados em terrorismo social.

    Façam um negócio decente e definitivo como já iniciaram no estado de MT:
    http://www.zsee.seplan.mt.gov.br/zsee/

    Mapeiem as áreas, determinem onde pode e onde não pode, fiscalizem por satélite, e qualquer movimentação estranha, baixa os helicópteros.

    Kobberminer
    Veterano
    # jun/11
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    brunohardrocker
    Façam um negócio decente e definitivo como já iniciaram no estado de MT:
    http://www.zsee.seplan.mt.gov.br/zsee/

    Mapeiem as áreas, determinem onde pode e onde não pode, fiscalizem por satélite, e qualquer movimentação estranha, baixa os helicópteros.


    Isso é o mais correto a fazer, só que falta tanto profissional qualificado no mercado que pra um país com as dimensões do Brasil levariam-se décadas pra realizar um estudo completo e detalhado de todas as terras nacionais, e o seu posterior manejo.

    Um dos profissionais que trabalham com essa parte mesmo de mapeamento via satélite é o Engenheiro Agrimensor. Quantas pessoas voce já ouviu na sua vida dizerem que querem ser engenheiros agrimensores? Eu ouço quase nenhuma. Por outro lado, um profissional dessa área recém-formado consegue, pra início de carreira, cerca de R$ 5000,00...

    russobass
    Veterano
    # jun/11 · Editado por: russobass
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    Pô!!

    Eles sempre dão um jeitinho Brasileiro nisso.

    Não acredito na guerra cívil não.

    Kobberminer
    Veterano
    # jun/11
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    russobass

    Eles sempre dão um jeitinho Brasileiro nisso.

    Não acredito na guerra cívil não.


    É... falei na zuação mesmo...
    A Dilma vai esticar este prazo e daqui a uns 2, 3 anos talvez teremos nosso Código Florestal...

    Tava esperando os comentários dos ambientalistas não-pise-na-grama, mas nem...

    -Dan
    Veterano
    # mai/12
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    A presidente Dilma Rousseff fez 12 vetos e 32 modificações ao novo Código Florestal, informaram nesta sexta-feira (25) os ministros da Advocacia Geral da União (AGU), do Meio Ambiente, da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário. Para compensar os cortes e adequar o texto aos propósitos do Planalto, será editada uma medida provisória com ajustes e acréscimos.

    O objetivo dos cortes e mudanças no texto aprovado no Congresso, de acordo com o governo, é inviabilizar anistia a desmatadores, beneficiar o pequeno produtor e favorecer a preservação ambiental. Os vetos ainda serão analisados pelo Congresso, que tem a prerrogativa de derrubá-los. O artigos vetados serão detalhados junto com o envio da MP na segunda-feira (28).


    http://g1.globo.com/politica/noticia/2012/05/presidente-dilma-vetou-12 -artigos-do-novo-codigo-florestal.html

    Atom Heart Mother
    Veterano
    # mai/12
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    acho esse assunto chato pra carai

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