Bendsup Veterano |
# jun/08
· votar
Lionel Loueke: "Karibu" (Jornal do Brasil, 27/04/08)
Nascido no Benin, há 34 anos, o guitarrista Lionel Loueke não é um músico autodidata e exótico "descoberto" por acaso na África Ocidental, e que passou a ter sucesso, no mundo hoje sem fronteiras do jazz, graças ao apadrinhamento de excelências como Herbie Hancock, Wayne Shorter e Terence Blanchard. Adepto da música pop planetária, começou a estudar música a sério em Abidjã, na Costa do Marfim, quando tinha 16 anos. Viveu e tocou durante algum tempo em Paris, e acabou por merecer uma bolsa para o célebre Berklee College of Music, em Boston. Numa recente e sincera (como é de seu feitio) entrevista à National Public Radio (NPR), o violonista / vocalista conta que só descobriu o jazz em Abidjã ao ouvir um disco de George Benson, que um amigo trouxera de Paris: "Eu não sabia o que ele (Benson) estava fazendo, nem mesmo que aquilo era improvisação. Mas soube logo que era alguma coisa que eu queria fazer".
Loueke está agora na crista da onda, com o lançamento de Karibu, seu primeiro cd, na condição de líder, para o célebre selo Blue Note - que se proclamava "The finest in jazz since 1939" até adotar, já fàz um bom tempo, uma política mais flexível, com a inclusão em seu catálogo de estrelas pop que vão de Norah Jones a DJ Smash, passando pelo trio Medeski Martin and Wood e grupos fusionistas similares. Karibu (bem-vindo, em suaíle) não é no entanto, um disco comercial, embora possa ser admirado - ao mesmo tempo, no todo ou em parte - por jazzófilos, amantes do folclore da África e baixadores contumazes de "músicas" em seus iPods. O guitarrista - fluente em suaíle, no dialeto de seu país (fon), em francês e inglês - é também um poliglota musical em termos de melodia e ritmo (sempre com suingue). No violão - que usa também de maneira percussiva, assim como a voz - exibe raras, refinadas e econômicas harmonias.
Antes de Karibu, Loueke já gravou dois cds para selos indies, entre os quais Virgin forest (ObliqSound), registro bem mais colorido, com parceiros de personalidades tão diversas como Hancock, o percussionista Cyro Baptista e o gaitista Grégoire Maret. Mas ficou mesmo conhecido depois de atuar no álbum Bounce (Blue Note), de 2003, do trompetista Terence Blanchard, na companhia dos emergentes Robert Glasper (órgão, Fender Rhodes) e Aaron Parks (piano). E de aparecer como sideman em River: the Joni letters (Verve) , a confeitada homenagem de Herbie Hancock a Joni Mitchell que arrebatou o principal Grammy da safra 2007.
Em Karibu, Loueke tem como base o trio habitual com Massimo Biolcati (baixo) e Ferenc Nemeth (bateria), em nove faixas, das quais sete do líder, mais versões muito originais, em matéria de tempo e de timbre, de Naima (7m), de John Coltrane, e Skylark (6m47), de Hoagy Carrnichael. O notável Wayne Shorter (sax soprano) vai às alturas em temas como Naima e volta com Hancock em Light dark (10m), ponto culminante do álbum. O pianista-guru de Loueke é brilhante também em Seven teens (6m57), cujo título vem do singular compasso 17/4.
É difícil dizer se as vocalizações, em geral plangentes, do guitarrista comandam o fraseado do instrumentista ou vice-versa. Ele domina o léxico do jazz e não esconde a influência de Jim Hall, sobretudo nas faixas em trio, como Skylark. Paul de Barros, que conferiu quatro estrelas ao cd na Downbeat, ressalta a influência da música brasileira (bossa nova) nas vocalizações "meigas" e na guitarra acústica "suave" de Loueke.
|