adnz Veterano |
# ago/05
Sôra, posso ir beber água? Espera teu colega voltar. CH4! Ligação Covalente Apolar, o colega voltou, eu esperei a explicação acabar, na verdade não sei, cinco minutos depois do colega ter voltado eu me levantei do nada e saí, fui beber minha água. Achei interessante aquela sensação, apesar da professora ainda ter o controle sobre mim pareceu que não, me senti bem, mesmo sabendo que não fazia nada de errado. Me sinto bem fazendo o errado, mas ao mesmo tempo não o faço, não vejo sentido em conflitar com algo. Enfim, no caminho até o bebedor, talvez uns vinte passos curtos, dei uma espirrada e resolvi ir ao banheiro assoar o nariz. Cheguei no banheiro e espirrei de novo, agora sim, com gosto, percebi que a sensação de espirrar é quase 'orgasmica'. Saindo do banheiro, pelo corredor meio estreiro e longo, uns quinze metros, de um lado o salão, do outro o resto do colégio e os quatro andares abaixo e um pouco do bairro, carros, ônibus, pessoinhas pequenas passando lá longe. Então, por longos segundos parei para olhar tudo isso, percebi na árvore no meio da escola, que sempre esteve alí, mas que eu nunca realmente olhara. Percebi nas casas dos passarinhos, lá no teto, bem acima, algo que eu já tinha percebido anos atrás. Estava frio, então fiquei alí, torrando no sol gelado que me esquentava. A formosa luz solar, que dava forma mais bela a todos objetos e a todas pessoas era a mesma luz que se escondia e dava lugar a escuridão, a balança natural. Saí dali, continuei andando no corredor, mas olhei pra trás, fitei a parede que eu acabava de me encostar para ver tudo aquilo e ví que me viam. Me observavam desesperadamente; ví uma câmera. Colocaram câmeras pelo colégio inteiro, um, dois meses, não sei certamente, só sei que aquela câmera me fitava, todo santo dia, eu olhava pra ela e ela me olhava, eu até ficava assustado ás vezes. Todas outras câmeras não eram assim, eu as ignorava, mas aquela não, era impossível, ela atraía meu olhar de um modo irresistível. Quando eu olhava, me surpreendia. Ela parece o olho que tudo vê, do mal, as outras parecem inocentes, mas aquela não, ela é má. Virei e continuei andando para a sala, tentando ignorá-la, usando o máximo da minha força de vontade. Passei pelo bebedor, bebi água, algo que só bebo no colégio mesmo. Me virei e vi a mãe de um aluno da oitava série, uma senhora de idade, sentada na escada. Um senhor de idade também, marido dela, suponho eu, ficava no colégio também, o filho andava em cadeira de rodas. Todo santo dia, duzentos pra ser sincero, eles ficam alí, esperando os cinco períodos onde o filho aprende algo, eles esperam. Eu já tinha conversado com o senhor mês passado, numa dessas que eu chego atrasado no primeiro período e a professora não me deixa entrar. Colégio, matérias, provas, enfim, o mundo. Pareciamos ambos sábios que sabiam o que o outro sabia, foi interessante, eu achei interessante, um garoto de quatorze anos falando de gente pra gente com um senhor com mais de sessenta acredito eu. Não toquei no assunto do menino, achei insensível, não sei se ele reagiria bem ou mal, acredito que bem, mas preferi não arriscar nada: dobrei a passada até a senhora, com o intuito de conversar, dar um oi, sei lá: ví que ela chorava, apertava os olhos; dobrei a passada em direção a sala de novo, ela não me viu. No momento não pensei muito, só achei ridículo um menino tentando amparar uma senhora de idade. Voltei, a minha mente perguntava-se por que: eu sabia a resposta mas imaginava outras, é triste. Tentei me colocar no lugar dessas pessoas e não consegui, o que eu mais faço é isso, analisar situações e me colocar no lugar, sentir a dor, aproveitando minha intensidade sentimental ás vezes consigo ser quem eu quero, substituir. Ah, e eu fiquei pensando.
Sôr, posso ir assoar o nariz? Espera a... Aquela lá voltar. Não! Me faz um favor, vai lá na sala dos professores e vê se eu deixei um estojo preto na mesa. Fui lá, eu já estava acostumado em ir pra lá e pra cá no colégio, conhecia aquilo melhor que a palma da minha mão, quase dez anos, demais. Desci os quatro lances de escadas, com uns quinze ou dez degraus cada e segui no corredor do segundo andar, o pátio é interessante, cheio de árvores, olhei pra árvore que eu tinha fitado lá em cima e lembrei que na primavera ela fica cheia de flores rosas, é bem interessante. Baixei um pouco minha visão e vi o senhor e a senhora, abraçados, combatendo o frio com calor humano. Virei a direita, olhando aquilo quase passara sem perceber da sala dos professores, procurei, procurei, não achei o estojo preto do professor. Emiti um gemido: Gahhh! Eu já tinha ouvido esse gemido em algum lugar e hoje ele voltara a minha memória, gah, gah, não lembro onde. Voltei rapidamente, subi as escadarias de novo e no último andar, fitei de novo, a câmera do mal. Agora me acalmei, continuei reto até o banheiro sem olhar pra ela, ultrapassando as barreiras do controle mental. Entrei no banheiro, salvo, assoei o nariz, espirrei e propositalmente: Gahhh! O gemido e a sensação do espirro, depois um: Ahhh! De prazer. Voltei pra sala: Não achei não, sôr. Fiquei pensando.
O que faz aqueles dois seres elevados esperarem tanto tempo uma resposta? Os limites da paciência são testados, ás vezes de maneiras rápidas, ás vezes de maneiras bizarras. Minha reflexão sobre tudo isso recém começara e eu já não sabia por onde começar, são muitas hipóteses, são muitas... Procurei uma palavra para organizar o pensamento e tentar descobrir o que fazia aquilo, o que fazia? Achei a palavra que ecoou na minha mente: Amor.
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