Música e Estética - por Sydney Molina

Autor Mensagem
Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05 · Editado por: Fritz_mkvl


Eu postando aqui pra vocês um artigo do Sidney Molina que achei em uma Guitar Class antiga e achei bastante interessante. Aqui vai:

Música e Estética 4

Nem sempre a audição passiva predominou sobre a escuta ativa. Outros momentos da nossa própria cultura ocidental trataram a música como parte integrante da formação de todo ser humano.
Nem sempre tocar um instrumento, tocar ou compor foram atividades restritas a especialistas; ao contrário, em muitos momentos o fazer e o refletir sobre música foram tidos comouma nescessidade básica, e isso incluía homens e mulheres comuns, de todas as idades e profissões. Como exemplos, podemos citar a consciência que o mundo grego teve, desde o período pré-socrático, de que todas as proporções geométricas e numéricas presentes na natureza estariam diretamente relacionadas - e até subordinadas - a estruturas musicais; ou do papel que a música ocupou entre as ciências do quadrivium na Idade Média, ao lado da matemática, da geometria e da astrologia; ou da importância que o canto eo contato artesanal com os instrumentos musicais tiveram durante o longo período que abarcou o Renascimento, o Barroco e o Classicismo; ou ainda da concepção da música como "essência do mundo", predominante durante todo o Romantismo. Isso para não mencionarmos com mais detalhes a presença da música nos rituais, sejam eles religiosos ou não, orientais ou ocidentais, africanos ou americanos.
Como no entanto, esses outros tempos e lugares articularam níveis de escuta musical?
Foi o músico e filósofo Ricardo Rizek que nos mostrou, certa vez, um famoso trecho da Epístola XIII atribuída ao poeta Dante, onde é mencionado que um texto pode ser lido sucessivamente ou simultaneamente em (até) quatro diferentes níveis, e que esses quatro diferentes níveis poderiam ser representes tipológicos das inúmeras leituras possíveis de um texto. Se há um grau de subjetividade na leitura de um texto ou na audição musical, se há "uma leitura para cada leitor" e uma "audição para cada ouvinte", para o mundo de Dante, entretanto, essa subjetividade não é absoluta: ela é, por assim dizer, "organizada" pelos quatro níveis. São eles: o nível literal, o moral, o analógico e o anagógico.
Fazendo uma transposição da literatura para a música - o que poderíamos chamar tecnicamente de uma "mudança de tom" -, podemos dizer que o nível litera assemelha-se ao que o pensador francês Jean Piaget chamaria de estágio sensório-motor do desenvolvimento humano: aqui, uma música não é "escutada", mas apenas "ouvida"; ocorre quando a música é recebida passivamente pelo corpo, é a música "que mexe com o corpo da gente", como diz um samba um pouco antigo. Muito da música pop e do rock fundamenta-se sobre esse nível, dança fundamenta-se sobre esse nível, não importando se vem da Inglaterra ou da Bahia, da Jamaica ou de Viena. Obviamente, basta haver som para "mexer com o corpo", mas certos artistas são especialistas nessa área, o que faz com que essa pulsação básica possa assumir, em alguns casos, formas de grande sofisticação.
O nível moral de Dante pode assemelhar-se ao estágio psicoemocional de Piaget: aqui, não apenas "somos ouvidos" visceralmente pela música, como ocorria no nível anterior, mas passamos a opinar sobre ela. Aqui a música "diz" algo, e nós reagimos a "esse algo". Esse "dizer", esse "despertar emoções" freqüentemente parte da letra de uma canção, mas pode também ser deflagrado pelos misteriosos caminhos pelos quais a música instrumental acessa nossa subjetividade. Muito da canção romântica, das músicas mais lentas, com tears, in heaven or not, sustentase sobre esse nível.
Já o nível analógico de Dante pode ser resumidamente apresentado como estrutura-formal: aqui a escuta é mais objetiva, mais técnica. É esse o nível que buscamos acessar através do estudo de música, o nível no qual procuramos entender a forma, perceber recorrências motívicas, buscar a relação entre texto, melodia, harmonia, arranjo e instrumentação, apreender a relação do tema com a improvisação, ou com a variação, ou com o desenvolvimento, atentar para cada nota, para cada timbre, para cada tempo de uma música. Só a ingenuidade, a ignorância ou a má fé podem achar que compreender a música pode tirar o prazer de ouvir a música: ao contrário, se a obra tiver qualidade, a experiência estética será aprofundada com a compreensão; se, por outro lado, a música for fraca, teremos a oportunidade de desligar o rádio, não comprar o CD e, talvez, sair mais cedo de certos shows. Ninguém precisa se envenenar com música ruim.
Para Dante, no entanto, resta um quarto nível. O nível anagógico não pode ser facilmente comentado sem uma referência explícita à filosofia e à mística da Antigüidade e da Idade Média; podemos dizer, no entanto, que ele se manifesta em caso muito especiais, quando a experiência de escuta musical transmite algo fundamental, tão íntimo quanto essencial; algo que, de certa forma, parece que nos transforma definitivamente. Nem todas as pessoas ouvem música com tanta profundidade, e nem todas as músicas podem ser ouvidas assim; ao mesmo tempo, esse nível não pode ser atingido por nenhum "programa regular tradicional de estudos musicais"; só quem viveu a experiência, diz-se, pode saber o que ela significa e no que ela implica. Para Dante, só uma obra que tenha chegado a esse nível pode ser nomeada como uma verdadeira "obra de arte", o que não quer dizer que ela não tenha também os outros três níveis dentro dela. Cada nível de escuta musical, cada camada de inteligência sonora apreendida abarca as anteriores.
Se o escutar sobrepõe-se ao ouvir, a conquista anagógica transcede a escuta e passa a "auscultar" o interior das coisas; é isso o que talvez possamos tentar, precariamente, extrair da obscuridade do fragmento número 50 deixado pelo filósofo pré-socrático Heráclito de Éfeso:
"Se não ouvirem simplesmente a mim, mas se tiverem auscultado o logos, então é um saber (que consiste em) dizer igual o que diz o logos: tudo é um"

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05 · Editado por: Fritz_mkvl
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O povo, dá uma lida aí, mó trabalho digitar isso tudo.

Blonde Hammet
Veterano
# jul/05
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pqp

resume ae

Joano Fritador
Veterano
# jul/05
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Interessante essa analogia que ele fez, uma ligaçào interessante entre dois âmbitos do grupamente artistico metafisico.. Porem, me parece um pouco viajante e de dificil compreensão..

Abraços

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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Joano Fritador
Pra mim parece objetivo o suficiente. Mas é meio chato de entender mesmo.

StoneColdDead
Veterano
# jul/05
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legal.... mas alguem pode me esplicar da onde vem "anagogico"???

timeisonmyside
Veterano
# jul/05
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ta va na guitar class né?
eu ja tinha lido é interessante, mas neste forum é besteira a maioria das pessoas ouve musica e toca só pensando pensando na tecnica e deixam de lado a parte emocional ou fazem o contrario..
ou seja cara, voc teve boa intenção e montou um topico bom pra caralho, mas deu caviar pra burro....

Papa Urubento XVI
Veterano
# jul/05
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timeisonmyside
maioria das pessoas ouve musica e toca só pensando pensando na tecnica

é assim q tem q fazer

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05 · Editado por: Fritz_mkvl
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StoneColdDead
Anagógico: 1. Relativo a anagogia (dãã) 2. indutivo

Anagogia: 1. Elevação da alma na contemplação das coisas divinas; extâse,, arrebatamento, enlevo. 2. Interpretação das Sagradas Escrituras, ou de outras obras, como as de Vírgilio, Dante, etc., que permite passar do sentido literal ao sentido místico.

E viva o Pai dos Burros.

lula_molusco
Veterano
# jul/05
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mto grande...nem li.

timeisonmyside
Veterano
# jul/05
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Papa Urubento XVI
voc fala mal de machado de assis, não da pra discutir contigo, voc é quase tão sem noção quanto o filosofo grego.....

heathcliff
Veterano
# jul/05
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não entendi porra nenhuma do último lance...o anagógico...


achei muito interressante, valeu aí
Fritz_mkvl


=]

Papa Urubento XVI
Veterano
# jul/05
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timeisonmyside

música só é música se tiver técnica e fritação no limite, de 200bpm pra cima.

timeisonmyside
Veterano
# jul/05
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Fritz_mkvl
dentro de dois minutos a lan cai....
bem basicamente acredito no texto: dante é foda, e contrariar ele usando o malmsteen como referencia que nem certo imbecis vão fazer aqui é algo no minimo burro....
Outra coisa legal: os conceitos literarios e linguisticos dão conta de estruturar qualquer manifestação artistica.

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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Valeu aí quem leu, foi um trabalho do cão digitar isso tudo.

heathcliff
Veterano
# jul/05 · Editado por: heathcliff
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esquece

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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sobe

heathcliff
Veterano
# jul/05
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timeisonmyside
os conceitos literarios e linguisticos dão conta de estruturar qualquer manifestação artistica.


não entendi, me explica?

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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heathcliff
Pra mim quer dizer que você pode explicar a música através de conceitos literários e linguisticos.

heathcliff
Veterano
# jul/05
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Fritz_mkvl

entendi mas...sei não viu...música é tipo magia (daqui a pouco começam a me malhar...)

timeisonmyside
Veterano
# jul/05
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heathcliff
é cara este conceito de magia que voc fala não dá pra medir né? bem cara o que quis dizer é o seguinte: a critica literaria e a linguistica (que é a ciência que lida com a lingua) tem teorias sobre o texto e como ele é construido que podem ser aplicadas em qualquer tipo de arte, fazendo suas devidas adaptaçãoes que é o que o cara fez neste texto: utilizou dante e adaptou seus conceitos...
poderia citar um outro exemplo:
na escrita voc tem sempre dois niveis: o sintagmatico e o paradigmatico, o primeiro ordena os elementos de uma frase o segundo é que compreende quais são estes elementos, na pratica: voc pode dizer o cão é rosa, o cão é branco, branco é o cão certo?
na musica voc pode ter estrofe - refrão- solo, solo - estrofe - refrão, solo -interludio-refrão, certo? bem dai vai longe...

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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sobe de novo (quem sabe alguém lê).

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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e

StoneColdDead
Veterano
# jul/05
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timeisonmyside
O_o.... acho q nao foi bem isso nao..... nao eh nivel de contrução e sim de interpretação/apreciação do texto/musica....


Fritz_mkvl
valeu... nao tinha achado no dicionario aqui em casa... aqueles pequeninhos podres saca....

Fritz_mkvl
Veterano
# jul/05
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StoneColdDead
Aquele aurélião até que foi um bom investimento.

Mr Moses
Veterano
# set/05
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Fritz_mkvl

Muito legal o texto, cara. Pra parar e refletir.

Querem entender em menos de 24 minutos o que é o tal nível anagógico??

Peguem um bom fone de ouvido, deitem-se em suas camas, desliguem-se do mundo, e escutem "Echoes" do Pink Floyd. se vc não tiver um momento de êxtase, desista da música... heheheh

Abraços

teuabreu
Veterano
# set/05
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Muito legal, cara!

ateobaldo
Veterano
# set/05
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eu sei q essa é uma pergunta meio besta,mas:
o q é um guitarrista técnico?

spy2k
Veterano
# set/05
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Fritz_mkvl

gostei bastante do texto, só infelizmente não entendi a citação do nosso amigo Heráclito.

prescot_san
Veterano
# set/05
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ateobaldo
eu sei q essa é uma pergunta meio besta,mas:
o q é um guitarrista técnico?

Falando sério, pra mim é o cara que manja de teoria e sabe usa-la na prática, e que de preferência use esse conhecimento pra fritar hehehehe.

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