Das marcas do Natal

    Autor Mensagem
    Igão
    Veterano
    # dez/11 · Editado por: Igão


    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.

    Feliz Natal


    redstratocaster
    Veterano
    # dez/11
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.

    Feliz Natal



    Falo tudo

    neologist_
    Veterano
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.


    tl;dr

    mateussch
    Veterano
    # dez/11
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.

    Feliz Natal

    Feliz natal.

    Chap
    Veterano
    # dez/11
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.

    Feliz Natal


    Isso aí, cara. Parabéns.

    Dazoo
    Veterano
    # dez/11
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.


    [2]

    redstratocaster
    Veterano
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.




    kkkk, pensei q ninguem ia perceber o q eu fiz...

    Igão
    Veterano
    # dez/11
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    redstratocaster
    neologist_
    mateussch
    Chap
    Dazoo

    Flooders malditos.

    redstratocaster
    Veterano
    # dez/11 · Editado por: redstratocaster
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.



    Desculpa cara, floddar dá ban?

    Igão
    Veterano
    # dez/11
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    redstratocaster

    deve dar, mas não sou eu que vou denunciar, uahua

    mateussch
    Veterano
    # dez/11
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    Nunca entendi essa mania das pessoas de encarar. Elas encaram a porta do ônibus, a lâmpada do dentista, encaram a janela do trem, a poltrona da frente no avião, encaram a tudo e a todos enquanto pensam, enquanto esperam. Eu olho ao redor, observo as pessoas, entro num elevador e então, ao contrário de todos, encaro meus pés e penso o quão insignificante aquilo é para todos, que estão muito concentrados na porta. E quantas "portas" tem na nossa vida, que tomam nossa atenção do que realmente importa.

    Então é dezembro e eu ajudo minha mãe a desempacotar todas aqueles enfeites de natal. Apesar da minha alergia à poeira e das caixas mal organizadas, há algo em mim que me faz querer ajudar. Talvez resquícios de uma feliz infância, com toda aquela ilusão do natal e a eterna pergunta que eu fazia à minha mãe: "Por que não neva no nosso natal mãe? Como papai Noel vai saber que já pode vir trazer meus presentes?". Eram tempos fáceis, sinto até um aperto no coração só de pensar no quanto se perde de inocência e felicidade quando se cresce. Ouço guizos na porta, vejo o enfeite que diz "FELIZ NATAL" pendurado próximo à televisão como todo ano, o mesmo da minha infância, verde e vermelho, com flocos de neve desenhados, um velhinho das maçãs coradas e das barbas bem arrumadas. Ele não virá este ano, ele nunca vem. O curioso é que tudo tem um cheiro natalino, é a única expressão que conheço para descrever como cheiram as coisas nesta época do ano. A ilusão da vida nova, do perdão, do recomeço, do amor. É tudo ilusão. É só conveniente não pensar na dor, no sofrimento, na solidão, na saudade dos que partiram, no aperto financeiro, na ignorância alheia e em tudo mais que nos corrói de dentro pra fora, nos tornando menos felizes e menos longevos. E assim eu vou abrindo caixa após caixa, separando bolinhas tão coloridas, diversas bolas, vermelhas, amarelas, verdes, azuis, algumas mais trabalhadas com brilho, ou cobertas por linhas como se fossem um novelo de lã. Sempre apreciei árvores de natal e meu sonho um dia já foi comprar um pinheiro daqueles americanos, enfeitar com bolas natalinas de vidro, não estas simples de plástico, encher de luzes e fitas e tudo mais e ficar apreciando a minha arte. Então ceiar, deixar um copo de leite e biscoitos para o bom velhinho e partir para dormir. Colocava meu sapatinho na porta do quarto (já que meu quarto era no andar de cima e não teria como colocar na janela) e aguardava ansiosamente o amanhecer. Eu era a descrição do Espírito Natalino na manhã do dia vinte e cinco.

    Eu acordava por volta das oito, eufórico, corria para acordar minha mãe e desejar feliz natal e então ia direto para a árvore, pegar meus presentes. Ah, como a infância é majestosa. Tudo é fantasia, sonho, alegria. Como eu queria ter a mesma disposição. Agora estou aqui sentado, encarando meus pés, pensando nos meus compromissos e problemas enquanto alguém comenta a receita do pavê e então volto ao recinto quando perguntam "mais vinho?", aceito, agradeço e dou uma talagada. Bom vinho, percebe-se as notas amadeiradas do barril, fico me perguntando, sem esperanças de uma resposta, qual seria a composição daquele vinho, quais uvas, qual o barril, mas enfim, nada disso eu sei responder sem ler algum rótulo. Então alguém lhe pergunta como vai a vida profissional e quando você responde "normal, nada novo", torna-se perceptível que é só uma convenção aquela reunião. Apesar da minha descrença, eu sempre espero ver dos outros alguma atitude condizente com o que aquelas pessoas creêm. E ninguém liga, ninguém se importa. Natal, convenhamos, é só mais um dia. A grandeza do Natal é a comida, a bebida e os presentes. O Natal é um grito de desespero para as famílias que pouco comungam. Vivem ermos e esperam tornar tudo perfeito neste dia. É triste isso, mas soa tão feliz no dia que ninguém se importa, muito menos eu. A dor a gente engole calado e sorri para mostrar que está tudo bem. E o Natal acaba para todos, que voltam para suas casas, para suas vidas enfadonhas, para seus dias ordinários. E assim a vida segue, até o próximo ano e adiante. Todos encaram as portas, janelas, poltronas, paredes, mas ninguém encara os fatos e os problemas da vida.



    Desculpa cara, floddar dá ban?





    Que eu saiba não.

    redstratocaster
    Veterano
    # dez/11
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    ok, parei então (por via das duvidas)

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