A Crise na OSB - Discussão

    Autor Mensagem
    Kobberminer
    Veterano
    # abr/11 · Editado por: Kobberminer


    Deveria postar isso no fórum de Música Erudita, mas como as coisas lá são meio "adagio" demais, resolvi postar aqui mesmo :)

    Afinal, toda esta história (que creio ser desconhecida por boa parte dos músicos do fórum) diz respeito a algo que é muito valioso e caro a boa parte dos que tomam o ofício da música como ganha-pão: os direitos dos músicos no Brasil

    Bom, pra começar, vamos situar os participantes da "ópera":

    - A OSB (Orquestra Sinfônica Brasileira) é uma orquestra patrocinada pela Vale, com o apoio do BNDES e da Prefeitura do Rio de Janeiro. É uma das mais importantes orquestras do país, perdendo talvez apenas para a OSESP (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo)

    - Roberto Minczuk é diretor artístico (o cara que organiza a temporada de concertos, basicamente) e regente titular (maestro propriamente dito) da OSB

    Agora o libreto da peça, nas palavras de Milton Ribeiro:

    "O regente titular e diretor artístico Roberto Minczuk — neste acúmulo de cargos mora um grande perigo, é o mesmo que dar poderes ilimitados a uma potencial estrela — resolveu realizar, assim de surpresa, provas de avaliação de desempenho. A convocação aconteceu logo após o início da férias da orquestra e a ordem era que deviam prestar uma prova de avaliação do seu potencial artístico. É estranho, pois não há notícia de caso semelhante, nenhuma orquestra do mundo exige tal prova, pois a avaliação é diária. Mesmo as avaliações feitas na OSESP nos anos 90 foram realizadas de forma civilizada, de comum acordo e sem a espada da demissão sobre a cabeça de ninguém — quem era ruim ia para o time B tocar nos festins estaduais, quem era bom ficava no time e as vagas que sobrassem eram preenchidas por novos concursos. Era justo. Na OSESP, John Neschling [regente titular da OSESP] sabia que tinha um grupo fraco e que precisava reforçá-lo. De forma clara, justa e conversada, montou a maior orquestra do país.

    Como disse, as avaliações nas orquestras e mesmo nas empresas costumam ocorrer no dia a dia e não em provas de proficiência. Trabalhei numa multinacional onde havia um ranking de funcionários. Achava confortável, nada agressivo e lutava para ter resultados. As regras era claras e factíveis. A empresa estabelecia metas e a gente ia atrás delas com chances de recuperação e aconselhamento durante o processo. Neschling, na OSESP, sabia muito bem quem ia passar e quem não ia. E criou funções para seu time B. Havia necessidade? Mas é claro! Há concertos e concertos e há a necessidade das orquestras criarem conservatórios ou escolas, não?

    Porém, na OSB houve até um Programa de Demissão Voluntária (PDV). Além das indenizações garantidas pela legislação trabalhista à demissão sem justa causa (aviso prévio, multa de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS e saque do FGTS), o plano oferecia continuidade dos salários e do plano de saúde até o próximo mês de junho. Criou-se assim um impasse que o autor destas linhas vê como MUITO COMPLEXO, pois se havia desacordo sobre os critérios, tempo de preparação e a exigência inédita da prova, havia também o regente e diretor artístico.

    Roberto Minczuk, Roberto Minczuk... é apenas um Roberto Minczuk, nada mais, e desta forma deveria se comportar com um deles. Os músicos fizeram o maior barulho, alegando que não precisariam ser reavaliados, uma vez que já haviam passado por um rigoroso concurso para entrar na orquestra, no que têm razão parcial, em minha humilde opinião. Também diziam que não haveria tempo suficiente para se prepararem e reclamavam que deveriam ter sido convocados para colaborar na criação do sistema de avaliação, no que tem toda a razão. E protestavam que eram avaliados diariamente, no que têm carradas de razão. Ou será que Minczuk desconhece o grupo com o qual trabalha?

    Além disso, Roberto Minczuk não seria avaliado... Por que não? Vi-o reger duas vezes e suas concepções eram bastante discutíveis.

    A atual contabilidade mostra a dureza dos dirigentes da orquestra. Dos 82 músicos, exatos 41 não compareceram às duas chamadas para a avaliação. Destes, 31 já receberam o comunicado de demissão. Dos outros dez, sete estavam com atestado médico e foram convocados para uma nova audição, marcada para amanhã (06/04). E três também foram chamados novamente para a avaliação, por não terem recebido a convocação anterior.

    Os demitidos já entraram na Justiça do Trabalho. Enquanto isso, ensandecidos, a OSB decidiu cumprir o calendário de concertos deste primeiro semestre de 2011 com a OSB Jovem, orquestra formada por bolsistas. É a loucura completa. Parece uma caça às bruxas.

    Estranhamente, a OSB informou que não há relação entre a crise com os músicos que rejeitaram a avaliação e a série de audições para seleção de novos músicos que a direção da orquestra promoverá, durante o mês de maio, em Londres, Nova York e no Rio de Janeiro. O objetivo, segundo a fundação, é apenas a de preencher 13 vagas que estão abertas no corpo orquestral da OSB: seis para violino, três para viola e uma para violoncelo, clarineta, trombone e piano. Bem, então também não haverá segundo semestre, correto? Pois saem 41 e entram apenas 13! Muito estranho.

    Minczuk segue defendendo que as avaliações serviriam para elevar a orquestra a um padrão internacional. Conseguiu. O assunto está presente em todas as revistas e colunas mais ou menos especializadas do mundo. Não sei se Minczuk está feliz com o gênero de notoriedade alcançada. Mas acho que ele deveria escolher entre permanecer como diretor artístico — cargo que ele deve desprezar mas que lhe dá poder — ou regente. Isso, é claro, após o aval de uma banca de padrão internacional, como ele gosta."

    Fonte

    Pra finalizar, um depoimento de quem presenciou o auge da crise (por Thomas Pires Soares)

    "Eu estava presente na frente do Teatro Municipal!!!
    Foi uma bela manifestação! Pacífica, com vaias naturalmente, àqueles personagens já conhecidos da história que chegavam para o concerto. A parte dentro do Teatro, eu só vi no youtube! Depois, foi comovente a saída do público, sendo aplaudido pelos músicos demitidos que estavam TODOS (ao contrário do que o jornal O Globo noticiou) do lado de fora.

    Os demitidos que usaram a camiseta com o escrito "SOS OSB" estavam do lado de FORA do Teatro. As vaias dentro da "casa" vieram do público. Houve algumas pessoas do público indignadas com a situação, pois queriam ver o concerto, entretanto, isto pode se dever ao fato de estas pessoas desconhecerem a questão do processo todo.

    Além disso, os BRAVOS músicos da OSBJovem foram recepcionados pelos músicos demitidos, familiares dos mesmos, músicos de outras orquestras do Rio com entusiasmo, lágrimas de muitos ali, que se emocionavam com o grande feito dos Jovens, que bravamente e com muita elegância, protestaram contra toda esta situação que fragiliza seus "professores"(músicos demitidos) simplesmente, se levantando e não aceitando "fazer música" com um dos arquitetos (como afirmou a FOSB na TV) do projeto das reaudições (ou avaliação de desempenho). Este foi um momento histórico para a cultura brasileira, para a música brasileira, para a sociedade!!!!

    Que a democracia chegue até os palcos e, respeitadas as hierarquias orquestrais (maestro, spalla, chefes de naipe e músicos tuttistas), se faça música de qualidade, com respeito e dignidade aos profissionais, para o PÚBLICO DO BRASIL!!!"



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    Dissertem

    Tô com muito sono agora, mas precisava fazer o tópico
    Espero que dê uma saudável discussão :)

    Até amanhã

    makumbator
    Moderador
    # abr/11
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    Kobberminer

    Li nesse domingo uma entrevista interessante com o Minczuk na Folha de SP. Nela ele expõe suas razões, e pode-se concordar com algumas delas.

    Estou acompanhando o caso(até por ter amigos e ex-professores na orquestra). Ambos os lados tem sua dose de razão e sua parte de "intransigência".

    Darlan Felix
    Veterano
    # abr/11
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    Recebi no meu email que a OSB estava em crise. Vi que a OSB Jovem se recusou a tocar e inclusive escreveram uma carta:

    A música acima de tudo! Nós da OSBJovem acreditamos nesta afirmativa. Acreditamos que para haver música deve haver músicos, e que para haver músicos deve acima de tudo existir respeito. Frente a toda esta situação indissociável – onde uma ação imoral encontra respaldo na lei – a dignidade de toda a classe musical deve prevalecer e, assim sendo, a OSBJovem se manifesta de forma pacífica se recusando a tocar, não apenas por estarmos sendo usados para substituir a OSB profissional, o que é fato, mas porque hoje estamos no papel de ser o futuro da música no país, e não queremos que a realidade musical e social continue sem respeito, sem moral e sem diálogo. Embora em mais de uma ocasião tenha sido colocado que a FOSB e o maestro estão abertos a diálogo, não acreditamos que isso possa resolver a nossa situação como músicos jovens, uma vez que esse mesmo canal de diálogo foi aberto aos profissionais e a FOSB não transigiu, desencadeando este triste cenário em que o meio musical se encontra. Queremos a partir de hoje, de agora e para sempre, exercer nossa profissão, fazer música em um ambiente saudável e tendo como principio o respeito ao próximo. Hoje estamos aqui nesta situação e escolhemos agir, escolhemos nos manifestar em prol da música e da verdade, e é com todo o respeito à plateia de hoje e de sempre que não tocaremos hoje. Temos esperança nas coisas certas, e é com essa esperança que agradecemos e contamos com o apoio de todos vocês.

    Eu como um grande admirador da OSB, vejo que as coisas não são com imaginava.
    Muito linda a ação dos Jovens em defesa dos seu "Professores" como disse Kobberminer. Espero que toda essa situação se resolva.

    Kobberminer
    Veterano
    # abr/11
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    makumbator

    Tem algum link da entrevista?

    Eu acredito que boa parte dos argumentos que o Minczuk deve ter usado dizem respeito a "procura pela qualidade internacional" que mais parece uma navalha que vai em busca das cabeças dos músicos...

    Darlan Felix

    Muito bom o manisfesto!

    Frente a toda esta situação indissociável – onde uma ação imoral encontra respaldo na lei – a dignidade de toda a classe musical deve prevalecer e, assim sendo, a OSBJovem se manifesta de forma pacífica se recusando a tocar, não apenas por estarmos sendo usados para substituir a OSB profissional, o que é fato, mas porque hoje estamos no papel de ser o futuro da música no país, e não queremos que a realidade musical e social continue sem respeito, sem moral e sem diálogo.

    makumbator
    Moderador
    # abr/11
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    Kobberminer
    Tem algum link da entrevista?


    Não, li no jornal impresso. Mas assinantes da Folha de SP podem consultar no site do jornal.


    Eu acredito que boa parte dos argumentos que o Minczuk deve ter usado dizem respeito a "procura pela qualidade internacional" que mais parece uma navalha que vai em busca das cabeças dos músicos...


    Também, mas ele rebate algumas questões que os músicos apontam, como o fato de não terem sido avisados e não participarem das decisões. Ele rebate tudo isso com argumentos. Ficou a palavra dele contra a dos músicos

    Darlan Felix
    Veterano
    # abr/11
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    Kobberminer
    Segue o link da entrevista.

    http://www.osbempauta.com.br/posts-em-portugues/leia-a-entrevista-do-m aestro-roberto-minczuk-na-folha/

    Darlan Felix
    Veterano
    # abr/11
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    Acabei de ler a entrevista do Minczuk na folha. Muitos pontos que ele defende, eu concordo. Gostei do exemplo "Ronaldinho" e "Romário".
    Se o que ele disse na entrevista for verdade, a situação muda.

    JJJ
    Veterano
    # abr/11
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    Demissões "em massa" eu sou sempre contra. Independentemente de qualquer argumento.

    Ser humano não é gado, pra ser tocado "em massa".

    Natis
    Veterano
    # abr/11
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    Por um lado o maestro tá certo por zelar a excelência da orquestra com essas avaliações por outro lado ele está errado por ter demitido todo mundo(que por sinal era o que ele queria fazer desde o dia que ele e sua comissão inventaram essa avaliação)!

    Marcosrcf
    Veterano
    # abr/11
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    Lendo a entrevista dele, dá a impressão de que todos os músicos são uns belos de uns acomodados.

    Impossível formar uma opinião estando do lado de fora dessa bagunça... e sem conhecer ninguém.

    Kobberminer
    Veterano
    # abr/11
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    makumbator
    Também, mas ele rebate algumas questões que os músicos apontam, como o fato de não terem sido avisados e não participarem das decisões. Ele rebate tudo isso com argumentos. Ficou a palavra dele contra a dos músicos

    Darlan Felix
    Se o que ele disse na entrevista for verdade, a situação muda.

    Verdade... até me convenceu... Me lembrou do Neschling da década de 90, que de tão autoritário até se recusava a viajar no mesmo avião que os músicos viajavam (mas inegavelmente ele fez um ótimo trabalho)

    É... pelo jeito... o que tá prevalecendo é o velho no pain, no gain, mas como disse o Marcosrcf:

    Impossível formar uma opinião estando do lado de fora dessa bagunça... e sem conhecer ninguém. (2)

    makumbator
    Moderador
    # abr/11
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    Kobberminer
    Marcosrcf
    Darlan Felix

    Pois é, como falei fica difícil tomar um partido definitivo, pois ambos os lados tem razão. Como comentei antes, a entrevista dele é bastante racional.

    Provavelmente um meio termo seria o melhor, com o maestro cedendo um pouco e os músicos também se adequando em alguns pontos.

    Verdade... até me convenceu... Me lembrou do Neschling da década de 90, que de tão autoritário até se recusava a viajar no mesmo avião que os músicos viajavam (mas inegavelmente ele fez um ótimo trabalho)

    exato. Temos que lembrar que o Minczuk foi assistente do Neschiling.

    É importante lembrar que a OSESP antes dele estava em processo de extinção. Não tinha público, sala de ensaio(pediam emprestado), os salários eram baixos, e sem contar que realmente havia se tornado uma orquestra ruim(já foi musicalmente muito pior que o momento mais baixo da OSB). Hoje é a melhor do Brasil.

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