Sobre a percepção sentimental em variadas culturas musicais:

    Autor Mensagem
    Blackus
    Veterano
    # mai/10


    Partindo daqui e da discussão anterior a esse post especifico, no mesmo tópico, queria saber se alguém consegue comparar os recursos técnico-musicais associados a certos sentimentos ou climas na nossa música erudita aos recursos de outras culturas, como sugerido pelo Root...

    Porque eu acredito que a música em si, sendo simplesmente som organizado não traz em si mesma nenhum sentimento, é impossível que traga; sentimentos não se tornam ondas sonoras. Acho que os sentimentos são cultural e socialmente associados a certos maneirismos.

    Mas não sei. Então pensei numa possível comparação entre as percepções de cada cultura, porém não sou suficientemente versado em outras culturas para pensar nessa comparação sozinho, logo trouxe a discussão pra cá, pra ver se alguém mais se interessa no tema, que eu acho bem instigante, mas que é um tema que facilmente viraria um choque de ideologias fechadas ao invés de várias pessoas buscando entender alguma coisa, então, cabeças abertas =) que prolixo eu sou as vezes ein; minha professora de redação sempre fazia umas marcações gigantes nas minhas redações, assustada com a constatação "período de quinze linhas initerruptas!!!", mas isso pouco importa.

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10
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    Isso ai, estamos aguardando!

    Machine Gun Man
    Veterano
    # mai/10
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    Blackus
    Porque eu acredito que a música em si, sendo simplesmente som organizado não traz em si mesma nenhum sentimento, é impossível que traga; sentimentos não se tornam ondas sonoras. Acho que os sentimentos são cultural e socialmente associados a certos maneirismos.

    Sim, objetivamente a música seria apenas isso: como na linguagem, teria seu eixo sintagmático (melodia - sucessão de notas e silêncios em um tempo contínuo) e o eixo paradigmático (harmonia - notas simultâneas em acordes). Mas, por outro lado, a música não tem palavra, não tem linguagem própria, não fala por si só, a menos que seja situada em um contexto, a menos que se refira a algo que possa ser percebido como tal, e não como outra coisa qualquer. Como se fosse um código, fazendo menção a algo (e não a outra coisa) que não se diz expressamente (em palavras).

    Se trata-se de um código cultural, então o compositor, tendo em vista esta "codificação" de alguma forma já estabelecida, opera de modo a "amarrar" seu trabalho a uma significação, determinando a percepção que será feita dele. Eu acredito que essa relação não precise ser feita de modo consciente (ou de modo algum) por quem produz a música: e então, por exemplo, o não fazer sentido, por parte dele, pode ser percebido tanto como a ausência de significado (resultado esperado) como algo bem específico e incisivo. Mas o ponto é que há um conjunto de significações possíveis (mesmo que seus elementos sejam totalmente diferentes entre si) que traz consigo uma determinação negativa: a das significações não possíveis. E os pertencentes a essa cultura (já que esse foi o exemplo, mas poderia se tratar perfeitamente de um gênero musical ou qualquer estrutura de "codificação" própria), por sua vez, atribuem sentido segundo essa codificação, respeitando o conjunto de significações possíveis.

    Enfim, como você disse, sentimentos não se tornam ondas sonoras, mas, em um esquema estabelecido, um compositor pode trabalhar visando fazer menção a algo, e esse "algo" pode ser percebido pelas pessoas que pertençam ao meio onde esse esquema esteja em vigor - ainda que o "sentimento" não esteja ali, intrínseco ao som, mas sim no meio externo, na "cabeça" de quem cria e emite, e na "cabeça" do receptor.

    Bem, esse é meu ponto de vista - vago e abstrato - a respeito. Dele, segue-se que uma mesma obra pode ser percebida de modo diferente fora do "contexto" em que foi criada. Falta agora exemplificar. hahaha

    Quando estiver em casa, talvez...
    Há uma matéria sobre a música em uma tribo africana, mas pelo que me lembro, era tratada a parte matemática da estrutura musical dessa tribo, e não sei até que ponto isso é útil à discussão. De qualquer forma, vou conferir quando estiver em casa.

    Abraços.

    Alvaro Henrique
    Veterano
    # mai/10
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    Essa discussão começou com Aristóteles e ainda não chegou ao fim. Será que chegará?

    Stravinski era da mesma opinião do Blackus, que música só diz música.

    O que você propõe, no mundo de hoje é quase impossível. Vivemos sociedades multiculturais, então o efeito que desperta algo no pai já não desperta no filho, o que desperta no irmão não desperta na irmã, e assim por diante.

    Mas que algumas coisas despertam em algumas pessoas, isso é tão notório que pode ser usado como forma de tratamento médico.

    Pesquise por "psicoacústica". Essa é a área da ciência que estuda exatamente o que você quer saber.

    aisly kotzen
    Veterano
    # mai/10
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    Alvaro Henrique
    Pesquise por "psicoacústica". Essa é a área da ciência que estuda exatamente o que você quer saber.


    boaa =D +1

    eu prefiro ver o filme do pelé .... =/

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10
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    Alvaro Henrique
    Stravinski era da mesma opinião do Blackus, que música só diz música.

    Mas como é que ele acreditando nisso fez vários Poemas Sinfônicos?

    Blackus
    Veterano
    # mai/10
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    Mas como é que ele acreditando nisso fez vários Poemas Sinfônicos?


    Mas se você for ver, os poemas sinfônicos que tomam o significado romântico da expressão são mais do começo da carreira dele... observe a evolução dos ballets, por exemplo, que no começo era uma história bem articulada, passando pela sagração da primavera, que não tinha personagens definidas, nada, simplesmente a premissa do ritual, até o ballet Agon e o Pas de Deux, sem absolutamente nenhuma premissa literária, só a premissa da dança abstrata.

    aisly kotzen
    Viu, o Stravinsky pensava assim, e não era qualquer um. Pode parar de tocar guitarra, que nem prometeu no outro tópico.

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10 · Editado por: The Root Of All Evil
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    Machine Gun Man
    Blackus

    Eu acho que o que o Machie Gun Man postou faz muito sentido.

    Mas assim como o que o Alvaro Henrique postou sobre psicoacústica, eu acho que os sons podem sim carregar alguma propriedade que despertem em algumas pessoas.

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10
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    Blackus
    Mas se você for ver, os poemas sinfônicos que tomam o significado romântico da expressão são mais do começo da carreira dele... observe a evolução dos ballets, por exemplo, que no começo era uma história bem articulada, passando pela sagração da primavera, que não tinha personagens definidas, nada, simplesmente a premissa do ritual, até o ballet Agon e o Pas de Deux, sem absolutamente nenhuma premissa literária, só a premissa da dança abstrata.

    Então ele acreditava que podia ter sentimentos no início de carreira e depois mudou de idéia?

    A suíte Firebird é do começo da carreira ou do fim?

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10 · Editado por: The Root Of All Evil
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    Blackus

    Uma outra coisa que eu pensei outro dia foi o seguinte:

    O intervalo de trítono era proibido pela igreja justamente pelo seu caráter sombrio e obscuro, que remetia ao Demônio, tanto é que era chamado de "Diabolus In musica".

    Eu não acredito que esat associação ocorreu por alguém fazer músicas associadas ao demônio e utilizando trítono, de forma que a sonoridade do trítono ficasse atrelada a este caráter sombrio. Isto caracterizaria uma construção social da interpretação da sonoridade do trítono, que no entanto eu acho que não ocorreu, sendo assim, este intervalo carregaria em si a possibilidade de expressar este tipo de sentimentos.


    E mesmo que alguém tivesse feito músicas do demônio usando o trítono, acho que teria algum motivo inerente ao som para a pessoa escolher esta sonoridade pra tratar de algo sombrio.

    E obviamente por estar falando apenas de um intervalo, é uma abordagem bem simplista da coisa, mas acho que dela podemos ter uma visão sobre o assunto.

    J. S. Coltrane
    Veterano
    # mai/10
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    Talvez seja só uma questão de tempo até que o mundo esteja suficientemente dominado pelo capitalismo para que só haja uma cultura.

    Um dos maiores celeiros da música erudita hoje é a China, que desconhece em sua cultura tradicional a escala temperada, por exemplo. Mas ao se aproximar do ocidente, se aproxima também dos seus códigos.

    Scrutinizer
    Veterano
    # mai/10
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    The Root Of All Evil
    Ouvi que diabolus significa divisão, já que o trítono divide as duas oitavas igualmente.
    Não acredito que o trítono carregue "um sentimento", mas uma dissonância muito forte, é o intervalo mais dissonante gerado pela escala natural.
    Não uso isso como argumento, a inharmonia está sempre em timbres "bonitos", músicas "felizes", não acho proveitoso analisar o assunto nessa escala até onde sei, a música é dinâmica, e os resultados ocorrem pela movimentação do som.

    Dogs2
    Veterano
    # mai/10
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    pow, muito massa as idéias que foram colocadas aqui
    Não acho que esses dois pontos de vista diferentes sejam "ou é uma coisa ou é outra". Existem diversos "universos" de música, com diferentes abordagens e todas "funcionam", cabendo à sensibilidade de quem ouve (ou quem analisa) sacar o barato (se é "música por música" ou "música-recurso")

    Blackus
    Veterano
    # mai/10
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    The Root Of All Evil
    Firebird é do comecinho da década de 10. Não é que ele acreditasse antes e foi mudando aos poucos; é que ele começou a trabalhar com recursos da tradição anterior a ele e com o tempo foi aperfeiçoando a própria voz musical, foi conseguindo chegar mais perto do próprio ideal.

    Blackus
    Veterano
    # mai/10
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    O intervalo de trítono era proibido pela igreja justamente pelo seu caráter sombrio e obscuro, que remetia ao Demônio, tanto é que era chamado de "Diabolus In musica".


    O caráter obscuro provém do choque entre as frequências, que têm entre si uma razão muito complexa, ao contrário de uma quinta, por exemplo que tem uma razão de 1:3... é justamente isso que eu digo, as frequências estão lá, qualquer associação livre que se faça é um produto social. Ela têm alguma lógica, mas não são definitivas, tanto que hoje, o significado de um trítono pode ser variado.

    Blackus
    Veterano
    # mai/10
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    é verdade que eu não levei em consideração o seguinte: ondas sonoras não carregam nenhuma informação além de frequência, amplitude e intensidade, mas quando essas são convertidas em impulsos nervosos pelo ouvido, sabe-se lá o que acontece... ainda assim, acho válido tudo o que eu disse até agora, e ainda assim acho que há muito mais do que sentimento envolvido. Tem gente que lê o que eu escrevi e acha que eu tô desmerecendo a música, porque na cabeça delas sentimentalismos são a coisa mais nobre que há, mas não é isso, não estou desmerecendo, estou engrandecendo a música... Além dela carregar essas bobagens todas, ela tem algo maior que tudo isso, que é o pensamento humano.

    Ken Himura
    Veterano
    # mai/10
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    Pra mim, sentimento é mais da interpretação, coisa do intérprete. O compositor trabalha com sons, não com sentimentos - a menos que ele especifique isso por escrito (fieramente, con fuoco, smorzando, appassionato etc etc).

    J. S. Coltrane
    Veterano
    # mai/10 · Editado por: J. S. Coltrane
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    Ken Himura

    Fizeram esse tópico pensando em você, você vai escrever só duas linhas mesmo?
    edit: chato detected

    \/

    makumbator
    Moderador
    # mai/10
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    J. S. Coltrane

    Na verdade foram 3 linhas...hashashas!!!

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10
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    makumbator

    Só duas aqui =/

    makumbator
    Moderador
    # mai/10 · Editado por: makumbator
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    J. S. Coltrane

    edit: chato detected

    hahashsah!!!!

    The Root Of All Evil
    Só duas aqui =/

    Aqui aparecerem 3, mas depende da configuração de cada um, na verdade comentei só de zuação...heheh

    makumbator
    Moderador
    # mai/10
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    Agora sério:


    Stravinsky, que foi citado antes, é um exemplo de pensamento pragmático quanto a questão de "interpretação" . No livrinho dele, chamado de "A poética musical em 6 lições" (que é a compilação de um cliclo de palestras dele em Harvard)ele explicita textualmente que os músicos devem "apenas" tocar o que está escrito, sem querer tirar da partitura o que não está definido pelo compositor.

    Acho uma posição um pouco radical, e até "impossível" , uma vez que não existe uma execução "única"(apesar de haver a execução que o compositor imaginou em sua mente). Mas também pode-se pegar a idéia dele e usar como uma forma de se fugir dos excessos.

    Muitas das antigas idéias de que determinadas características sonoras provocam reações inatas nos humanos, não se sustenta(ocorre o mesmo com a linguagem falada e escrita, lembra-se daquele tópico em que comentei da tribo sem recursividade e noção de passado na fala?). Mas isso é muito complexo, e foge inclusive do âmbito da música(pois é até maior que ela, uma vez que se reflete em outras áreas).

    Machine Gun Man
    Veterano
    # mai/10
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    makumbator

    Três aqui também.
    Não liga, não. Tudo burguês, com monitor LCD de 20 polegadas, widescreen.

    :P

    james_the_bronson
    Veterano
    # mai/10
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    The Root Of All Evil
    Só duas aqui =/

    RICO!!!

    é verdade que eu não levei em consideração o seguinte: ondas sonoras não carregam nenhuma informação além de frequência, amplitude e intensidade, mas quando essas são convertidas em impulsos nervosos pelo ouvido, sabe-se lá o que acontece... ainda assim, acho válido tudo o que eu disse até agora, e ainda assim acho que há muito mais do que sentimento envolvido.

    Tendo a pensar assim...

    E o trítono pode ter virado coisa do capeta por fatores alheios à sonoridade. Alguém já deve ter comentado isso...

    Ken Himura
    Veterano
    # mai/10
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    J. S. Coltrane
    hauhauahauhauah

    The Root Of All Evil
    Veterano
    # mai/10
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    Ken Himura
    hauhauahauhauah

    Estamos esperando...

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